segunda-feira, 23 de junho de 2008

Shopping Não

Uma vez a minha amiga Milena foi lá em casa, e a gente conversou bastante. Puta saudade. Ela tava sumida. Trabalhando no Shopping Iguatemi. Falou sobre as colegas, a inveja, a competição, a pressão, a humilhação, a lavagem cerebral. Cara. Assustei. Queria muito que a minha amiga desse um pé na bunda do shopping e saísse fora. Mas ela precisava da grana pra pagar a escola, o cursinho. Vai dizer o quê? Eu já não gostava do shopping. Comecei a pegar ódio. A Milena tinha 16 - 17 anos. E tava presa naquele manicômio da humanidade. Puta raiva.

Naquela época eu não tava conseguindo dormir direito. Insônia. Suor. Agonia. Condenado a dias de marmota. Então eu levantava. Pegava o violão, às vezes o baixo. Papel e caneta. E de madrugada, na minha fuga da loucura, surgia "Shopping Não". Mas tudo que me vinha era uma ou duas frases, um ou dois acordes: "Não vejo mais os meus amigos. Não vejo mais você. Não vejo mais a mim mesmo."

Mas um dia foi diferente. Tava sol. Meus amigos Conde e Buzatto tavam lá em casa, na sala. Sabe quando os raios de sol estão fraquinhos, mesclando-se com a cor da cerveja no seu copo... as bolhinhas ficam lindas, cara. Então. Tinha mais uma galera, acho que era a minha prima Duda e seu rolo tocando Cajon com a gente. Surgiu uma jam. Comecei a tocar os acordes de "Shopping". O que veio em seguida foi o resto da música. Direto. Pá-pum. Improvisei o resto da letra, surgiu o ré do refrão, tudo se encaixou, e, se não me engano, o Conde inventou a frase "NÃO!! NÃO!! SHOPPING NÃO!", que lembra muito Twister Sisters, ou alguma outra banda brega de heavy metal dos anos 80 que deixam essa molecada emo de hoje no chinelo. Cara, o que eram aqueles vídeos do TS! Hahahh, tinha um que eles davam porrada num professor ou algo assim.

Bom, essa foi a gênese de "Shopping Não". Os Mortos?, seja qual for a formação, adoram dar vida a ela nos shows, porque sempre tem alguém que se acaba de cantar e berrar e pular e vem dizer pra gente: "Putz cara, eu trabalhei/trabalho no shopping e sempre quis dizer isso...NÃO VEJO A HORA DE BOTAR FOGO NO SHOPPING!! NÃO! NÃO! SHOPPING NÃÃÃÃO!!! "

Hahahah, cara, às vezes não consigo nem cantar direito nessas horas.

Foi hilário colocar nessa bela canção um protagonista que um belo dia surta e planeja botar fogo no shopping pra se libertar. Mas meu, não vai sair por aí botando fogo nas coisas e culpando os Mortos?, pôrra! A nossa reputação já é péssima perante a nobre sociedade contemporânea. Blah.

Nessa versão da música, Fernando Barbin finalmente tirou o seu contrabaixo acústico do quarto e criou um clima único e nublado-sujeito-a-eventuais-tempestades na canção. Buzatto também estava presente, soprando seu riff melódico-melancólico-meio-neurótico que nasceu junto com a canção. Roger dinamizou as fases do surto do protagonista e toda a sua revolta crescente com a alternância de abordagens rítmicas. Ah, e também apareceu um maluco que invadiu o palco e tocou cajon.

Ouça a histórica e proibida "Shopping Não bem AQUI.

Um fato interessante é que alguns anos após o surgimento dessa bela canção dos Mortos? eu tive contato com o livro de uma socióloga muito legal, a Valquíria Padilha. Achei o seu livro (Shopping Center: a catedral das mercadorias) na internet. Valquíria investigou o surgimento do Shopping nas nossas cidades e o que a "catedral das mercadorias" pode representar perante nossa sociedade, em sua pesquisa realizada no Brasil e na França. Foi tão legal ver que uma pesquisa séria e de peso acadêmico foi feita sobre o mesmo shopping que me incomodou tanto quando a Mí me contou a sua história. E eu descobri esse livro por acidente! Uma pena isso, né, que as pessoas tenham tão pouco acesso a trabalhos científicos interessantes como esse: o shopping center visto por uma ótica da sociologia. Tô lendo devagar, quero entendê-lo bem, e na hora certa vou postar sobre ele.

Valeu Valquíria! Muito legal o livro! =)

Um comentário:

Anônimo disse...

Oi moços!
Adorei os Mortos ontem! Muito loco!
Legal o blog, onde vocês vão tocar de novo?
Bjinhos,
Mara